O filme Minority Report celebrizou-se por
fantasiar a possibilidade de uma polícia que antecipava o futuro, realizando a
intervenção policial antes mesmo do crime se consumar. Na sociedade do filme,
comemorava-se um longo período sem a ocorrência de homicídios, já que os
pré-assassinos eram presos assim que a sucessão dos fatos apontasse para a
incidência de uma morte violenta detectada pela “máquina pré-crime”.
A obra leva ao extremo a legítima obsessão
policial pela prevenção, um princípio inalcançável, mas sempre perseguido.
Quando um crime ocorre o sofrimento já se deu, a vítima já chorou, o dano
jurídico já se consumou. Por isso é nobre a tentativa de evitar tais danos.
Tanto incorporamos (os policiais) a condição de
prevenir a violência que, às vezes, nos cobramos e somos cobrados por nos
anteciparmos a eventos inevitáveis, causando sensação de impotência aos policiais
e levando os analistas da atuação policial a conclusões equivocadamente
negativas sobre os esforços empregados pela polícia. Essa (auto)cobrança
excessiva acaba direcionando esforços e recursos para o impossível, e
desconsidera todas as nuanças não-policiais que podem fazer com que um crime
ocorra.
Óbvio que, mantendo todas as condições
constantes, é possível modificar o desempenho policial de forma a prevenir mais
ou menos crimes. Mas é perigosa, e frustrante, a síndrome de super-herói que
nos leva a colocar na polícia a fonte de toda prevenção.
Às vezes esse tesão por evitar o crime leva a
medidas extremas que inviabilizam a sociabilidade. Crimes só deixarão de
existir se as sociedades também não existirem. O conflito é consequência
natural das relações sociais, motivo pelo qual não se pode localizar em nenhuma
entidade ou pessoa a capacidade de prevenção plena dos atritos sociais.
Inviabilizar os crimes inviabilizando a sociabilidade é anunciar a ineficácia
do próprio Estado, aquele que deveria servir para tornar viável essa mesma
sociabilidade.
Quando um policial calça o coturno e vai às ruas
deve ter em mente sempre a possibilidade de prevenção. Sem falsos heroísmos,
ele deve usar a técnica, a legalidade e a criatividade para evitar violências.
A sociedade que lhe confiou esse mandato deve torcer para que tudo dê certo,
sem lhe exigir o inevitável, sem permitir intervenções que anulem a
sociabilidade.
Ao final do serviço, o policial deve se sentir
orgulhoso, e a sociedade agradecida, pois o resultado do conjunto de ações
preventivas realizadas por aquele homem ou mulher é um coletivo de sofrimentos
que deixou de existir. Fora disso, há a vida e a natureza humana, que sempre
nos reservará momentos de sofrimento.
Fonte: Abordagem Policial
Nenhum comentário:
Postar um comentário