24 de setembro de 2015

REFLEXÃO! "O ESTEREÓTIPO QUE ESTIMULA POLICIAIS BRUTAMONTES".

Ao ingressar em qualquer profissão, o indivíduo é submetido a categorias de preconceito que até então não lhe atingiam. Assim, no Brasil, o médico é visto como alguém bem-sucedido financeiramente. O professor como um profissional não muito valorizado. O  político como alguém de quem se deve desconfiar. Todos esses paradigmas são padrões socialmente assimilados após certa quantidade de acontecimentos que conferem sentido a esses entendimentos. De fato, não é difícil encontrar médicos abastados, professores mal pagos e políticos que traíram a confiança de alguém em nosso país.
Como o leitor deve desconfiar, também há um conjunto de concepções projetadas sobre o sujeito que passa a receber o título de “policial”. Das inúmeras categorias em que passamos a ser enquadrados – como a de pessoa inculta e intelectualmente rasa -, gostaria de destacar aquela que me parece danosa ao objetivo de avançarmos na construção de sujeitos policiais mais alinhados com a resolução pacífica de conflitos e com o respeito à legalidade cidadã.

Refiro-me ao estereótipo que considera o policial como alguém que, a qualquer momento, pode usar a força para intervir em questões de ordem pessoal, ou agir afetiva ou pessoalmente quando estiver na condição institucional (legal) de uso da força. O policial, para o brasileiro médio, é considerado o “irmão mais velho” a quem se pode recorrer para retaliações, ameaças e ofensas. Ou mesmo um brutamontes que sempre terá uma forma violenta de lidar com os seus problemas, a quem, portanto, deve-se temer.
A pergunta óbvia é: por que esse paradigma não é desfeito com a simples recusa dos policiais em vestir essa carapuça? Se um político pode ser muito franco e transparente em suas ações para negar o preconceito da desonestidade, o que leva um policial a manter-se inerte ao estereótipo que lhe atribuem?
Parece haver aí um problema de autoestima, em que o policial torna-se socialmente valorizado por ser um potencial autor de violência. Principalmente o policial homem sente-se importante por ser uma ameaça – e, algumas vezes, é instrumentalizado por terceiros que têm a oportunidade de usar essa ameaça para os fins que lhes interessem. Não é coincidência que esse mecanismo funcione particularmente com policiais homens, já que, desde a infância, aprendemos que “homem não leva desaforo para casa”.
Esse é um dos motivos que torna desafiador falar sobre policiamento comunitário, policiamento voltado para a resolução de conflitos e respeito à cidadania na segurança pública brasileira. Quando o meio social em que o policial está inserido o estimula ao uso da força informal, muitas vezes ilegal e abusiva, é difícil fazê-lo contrariar sua própria autoestima, que se alimenta dessa “razão de ser” extraoficial do seu trabalho.

Discutir as causas e os efeitos desse estereótipo é falar de machismo, do jeitinho brasileiro (que ninguém tratou melhor que Roberto Da Matta) e de formação policial, esta que tem o complexo papel de evitar que os policiais sejam capturados por essa dinâmica. O desafio é conduzir as tropas ao entendimento de que é muito mais vantajoso não ser um brutamontes.

Fonte: Abordagem Policial

Um comentário:

Anônimo disse...


Correto!

Parabéns pela matéria crítica e construtiva, ah quem dera, se 20% da própria polícia seja civil ou militar tivesse esse conhecimento, pelo menos o conhecimento, ficaria fácil a dominação da própria estima.

Ao contrário de um policial brutamontes é que está inserido nos cursos de Segurança Pública de todo o país as disciplinas de cidadania, e, princípios constitucionais de 1ª geração, direitos do homem (e mulher), Direitos Humanos, etc.

A harmonia policia e pessoal de cada policial frente ao combate ao crime em suas espécies deve pautar-se pelos direitos e garantias individuais, inclusive dos cidadãos policiais, por questão de Direitos Humanos a começar dentro da própria caserna para depois exteriorizar-se à sociedade.

Parabéns, mais uma vez pela matéria!

O conhecimento e sua divulgação faz a diferença em qualquer sociedade.